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Wednesday, January 31, 2007

O Despero da Piedade!


Cristo Quixotesco, acrílico s/tela, 40X60 cm, 2003
(col. Galeria O Rastro)
Meu Senhor, tende piedade dos que andam de bonde
E sonham no longo percurso com automóveis, apartamentos.....
Mas tende piedade também dos que andam de automóvel
Quantos enfrentam a cidade movediça de sonâmbulos, na direcção.
Tende piedade das famílias suburbanas
E em particular dos adolescentes que se embebedam de domingos
Mas tende mais piedade ainda de dois elegantes que passam
E sem saber inventam a doutrina do pão e da guilhotina
Tende muita piedade do mocinho franzino, três cruzes, poeta
Que só tem de seu as costoletas e a namorada pequenina
Mas tende mais piedade ainda do impávido forte colosso do esporte
E que se encaminha lutando, remando, nadando, nadando para a morte.
Tende imensa piedade dos músicos de cafés e de casas de chá
Que são virtuosos da própria tristeza e solidão
Mas tende piedade também dos que buscam o silêncio
E súbito se abate sobre eles uma ária da Tosca.
Não esqueçais também em vossa piedade os pobres que enriqueceram
E para quem o suicídio ainda é a mais doce solução
Mas tende realmente piedade dos ricos que empobreceram
E tornam-se heróicos e à santa pobreza dão um ar de grandeza.
Tende infinita piedade dos vendedores de passarinhos
Quem em suas alminhas claras deixam a lágrima e a incompreensão
E tende piedade também, menor embora, dos vendedores de balão
Que amam as freguesas e saem de noite, quem sabe onde vão....
Tende piedade dos barbeiros em geral. e dos cabeleireiros
Que se efeminam por profissão mas são humildes nas suas carícias
Mas tende maior piedade ainda dos que cortam o cabelo:
Que espera, que angústia, que indigno, meu Deus!
Tende piedade dos sapateiros e caixeiros de sapateira
Quem lembram madalenas arrependidas pedindo piedade pelos sapatos
Mas lembrai-vos também dos que se calçam de novo
Nada pior que um sapato apertado, Senhor
Tende piedade dos homens úteis como os dentistas
Que sofrem de utilidade e vivem para fazer sofrer
Mas tende mais piedade dos veterinários e práticos de farmácia
Que muito eles gostariam de ser médicos, Senhor.
Tende piedade dos homens públicos e em particular dos políticos
Pela sua fala fácil, olhar brilhante e segurança dos gestos de mão
Mas tende mais piedade ainda dos seus criados, próximos e parentes
Fazei Senhor, com que deles não saiam políticos também. (...)
Vinicius de Moraes

Ode aos Calhordas

Cabeça de Cristo Coroada, acrílico s/tela, 81X100cm, 2002
(col. paula Rovira)
Os calhordas são casados com damas gordas
Que às vezes se entregam à benemerência:
As damas dos calhordas chamam-se calhôrdas
E cumprem seu dever com muita eficiência
Os filhos dos calhordas vivem muito bem
E fazem tolices que são perdoadas.
Quanto aos calhordas pessoalmente porém
Não fazem tolices - nunca fazem nada.
Quando um calhorda se dirige a mim
Sinto no seu olho certa complacência.
Ele acha que o pobre e o remediado
Devem procurar viver com decência.
Os calhordas às vezes ficam resfriados
E essa notícia logo vem nos jornais:
"O senhor Calhorda acha-se acamado
E as lamentações da Pátria são gerais".
Os calhordas não morrem - não morrem jamais
Reservam o bronze para futuros bustos
Que outros calhordas da nova geração
Hão-de inaugurar em meio de arbustos.
O calhorda diz: "Eu pessoalmente
Acho que as coisas não vão indo bem
Pois há muita gente má e despeitada
Que não está contente com aquilo que tem".
Os calhordas recebem muitos telegramas
E manisfestações de alegres escolares
Que por este meio vão se acalhordando
E amanhã serão calhordas exemplares.
Os calhordas sorriem ao Banco e ao Poder
E são recebidos pelas Embaixadas.
Gostam muito de missas de acção de graças
E às sextas-feiras comem peixadas.
Rubem Braga

O Dia da Criação



Young Christ, acrílico s/tela, 35X50 cm, 2006

(disponível)

Hoje é sábado, amanhã é domingo

A vida vem em ondas, como o mar

Os bondes andam em cima dos trilhos

E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar.

Hoje é sábado, amanhã é domingo

Não há nada como o tempo para passar

Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo

Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo o mal.

Hoje é sábado, amanhã é domingo

Amanhã não gosta de ver ninguém bem

Hoje é dia de presente

O dia é sábado.

Impossível fugir a essa dura realidade

Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios

Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas

Todos os maridos estão funcionando regularmente

Todas as mulheres estão atentas

Porque hoje é sábado. (...)

Vinicius de Moraes

Friday, January 26, 2007

Nevoeiro

Cristo Navegador, acrílico s/tela,81X100cm, 2005

(col.Guida Cândido)




Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,/


Define com perfil e ser/


Este fulgor baço de terra/


Que é Portugal a entristecer-/


Brilho sem luz e sem arder,/


Como o que fogo-fátuo encerra./


Ninguém sabe que coisa quere/


Ninguém conhece que alma tem/


Nem o que é mal nem o que é bem./


(Que ânsia distante perto chora?)/


Tudo é inceto, nada é inteiro./


Ó Portugal, hoje és nevoeiro.../


É a Hora!





Fernado Pessoa

Crucificação


I R S, acrílico s/tela,81X100cm,2005
(disponível)




Vertical sou contra Deus.

Horizontal a favor.

Nesta cruz me crucifico.

Vertical com desepero.

Horizontal com amor.



Natália Correia

Vozes do Mar


Cabo Mondego, acrílico s/tela, 81X100cm, 2002
(col. Mário Mourato)
Quando o sol vai caindo sobre as águas/
Num nervoso delíquio d'oiro intenso,/
Donde vem essa voz cheia de mágoas/
Com que falas à terra, ó mar imenso?...//
Tu falas de festins, e cavalgadas/
De cavaleiros errantes ao luar?/
Falas de caravelas encantadas/
Que dormem em teu seio a soluçar?//
Tens cantos d'epopeias? Tens anseios/
D'amarguras? Tu tens também receios,/
Ó mar cheio de esperança e majestade?!//
Donde vem essa voz, ó mar amigo?.../
...Talvez a voz de Portugal antigo,/
Chamando por Camões numa saudade!
Florbela Espanca, Poesia Completa
Lisboa, Publicações D. Quixote, 2000

Tuesday, January 23, 2007

Melancia / Melão

Árabe, acrílico s/tela, 60X80cm, 2005

(col. do autor)
















Incongruência / Contradição
Veemência / Contravenção
Eloquência / Vaporização
Ignorância / Contaminação
Gerência / Masturbação
Sapiência / Direcção
Inconsequência / Ejaculação
Cedência / Capitulação
Credência / Cadeirão
Clemência / Canonização
Maledicência / Vacinação
Saliência / Foguetão
Carência / Anulação
Insignificância / Situação
Paciência / Trepanação
Cartomância / Castração
CIA / Cão
Dissidência / Deportação
Displicência / Mastreação
Dissonância / Ablação
Extravagância / Extradição
Fragrância / Exumação
Ganância / Saturação
Existência / Extinção
Jactância / Ebulição
Dependência / Escaldão
Delícia / Precaução
Deliquescência / Desagregação
Deliquência / Exultação
Arborescência / Razão
Estância / Declaração
MELANCIA!
MELÃO!
















Friday, January 19, 2007

Teias e silêncios


Paisagem, acrílico s/tela, 170X70cm, 2006
(col. Exército Português)
Ideia vaga
Memória
Longínqua
Arma
Arremessada
Boomerang
Lançado
Ao espaço
Medido
Por
Um
Tempo
Desperdiçado.

Thursday, January 18, 2007

Porcelana


Alentejana, acrílico s/tela, 60X80cm, 2004
(col. J.Paulo Santos)
Fada branca
Olhar meigo
E físico,
Gestos
Esvoaçantes.
Asas
De
Vaso
Chinês.

Sonhar

Camões, acrílico s/tela, 60X80cm, 2004

(disponível)
















Levito e
Varro em
Voo
Picado
O
Convés
Quando
Uma
Forte
Luz
Me
Bate em
Cheio
Na
Bússola e
Me
Avaria o
Norte.

Tuesday, January 16, 2007

Álvaro


Pessoa, acrílico s/tela, 35X50cm, 2006
(disponível)
São vinte e três horas e vinte e sete minutos quando estaciono no largo da pequena capela em Buarcos.
A noite é longa e festiva.
A noite é de S.João aqui na terra e na Figueira.
Saio do carro, bato a porta, assusto alguns noitibós e pardais que arrastam asas, debicando furiosamente em latas de cerveja que, aos milhares, cobrem a estrada, o chão, as mesas das esplanadas.
Com a bota esquerda, esmago metodicamente dois noitibós.
Com a bota do pé direito, e de um só golpe, varro com eficiência três pardais. Um, ainda rosnou. ...

Ricardo


Pessoa, acrílico s/tela, 35X50cm, 2006

(col. Alfredo Vieira)


O
Catavento
Gira sobre
Quatro pontos cardeais.
Tem
Um
Ponteiro
Ao
Centro
Que
É
Certeiro
Tal agulha de cristal.
O vento
É ligeiro
E brejeiro:
Ao
Catavento
Não pode fazer mal!

As Ocarinas



Underground, acrílico s/tela, 50X60cm, 2ooo

(col.Galeria O Rastro)

Passa a banda

Passa o bombo

Toca o samba

Assusta o pombo

P'lo ar a baquette

Estilhaço de coração

E o clarinete

De tromba negra p'ró chão

Passam as ocarinas

Vestidas a rigor

Da cor das tangerinas

Sabem as modas de cor

Normais e normalizadas

Casuais e bem casadas!

Monday, January 15, 2007

Alberto Caeiro



Pessoa, acrílico s/ tela, 35X50cm, 2006

(col. Guida Cândido)










Sou e sei



De mim



Engeitado



Estacionado



Em parcómetro



Aprazado



Observado



Por palhaços



Enfeitados



Semelhantes



A espantalhos. ...


















Gelo

Ice Age, acrílico e óleo s/tela,
150X70cm, 2006

(disponível)









PERIGO!!!
CAMPO DE MINAS!
(É FAVOR NÃO ESTACIONAR)

Padrão

Cabeça de Cristo, acrílico s/tela, 81X100cm, 2002
(col. Paula Rovira)



Com o correr
Dos anos
Vou sendo
De ti
Conquista,
Colónia
De perigos e guerras
Esforçados
Em madrugadas
De padrões
Plantados
Por mim.

Palmeiras




Alentejo, acrílico s/tela, 81X100cm, 2004
(col. José Tarrafa)











Uma débil brisa de Noroeste varre completamente a cidade da Figueira da Foz, dobrando duas palmeiras até ao passeio, onde se aprumam alinhadas e orgulhosas de seus portes altivos e da importância das suas raízes.

Resolvem todavia acabar de vez com aquela estática posição de há uns anos, contemplativa de mais para os seus gostos de palmeiras africanas, ainda com o arrojo e a aventura marcados nos seus genes.

Transplantam-se, e eufóricas, serpenteiam em linha recta até ao Cabo Mondego, onde finalmente respiram aquele ar puro e carregado de cal, acabada de extrair da encosta solarenga da serra e que lhes avivam as seivas.

Kid Crioulo



O Espanto, acrílico s/tela, 40X60cm, 2006


(col. José Luís Ribeiro)





No saloon, o ar fica de se cortar à faca quando entra Kid Crioulo, perigoso pistoleiro a soldo, mercenário nas horas vagas.


Os clientes, aterrados com aquela entrada, dão vários passos para trás, puxando as culatras à frente, engolindo em seco seis vezes, número equivalente à capacidade do tambor do revolver de Kid.


Alguns dos frequentadores estão corajosamente sentados sobre os seus próprios suores, enquanto outros vão entoando cantos gregorianos como que adivinhando a proximidade de um fim.


Kid chega-se ao balcão e vocifera tenebroso:


- Quero um galão fraquinho e uma torradinha com pouca manteiga, por favor...

Friday, January 12, 2007

O Candidato



Ferido de Constitucionalidade,

acrílico s/tela,81X100cm, 2005

(col.Mário Mourato)

O Candidato

Perfila-se

E

Mede

A Distância

Que

O

Separa

Da

Meta

Que

O

Meta

Na

Corrida

De

Cabeça

Na

Lista. ....

O Passo



O Passo, acrílico s/tela, 81X100cm, 2005


(col. Ana Quelhas)









Um dia



Entrou por mim



Adentro



Uma fada branca



Olhar meigo



Toque subtil,



Físico. ....



Tuesday, January 9, 2007

As Plantas



Erotic, acrílico s/tela, 70X70cm,2002
(col. Graça Marques)
















Vivem no nosso meio alguns tipos de plantas.
Vêmo-las por aí, pelos jardins públicos, campos e bosques, quase sempre estáticas, numa indiferença vegetal, assumindo variadas colorações de verde, consoante as estações do ano. Estas são as plantas do exterior, porque as que temos em casa, são plantas do interior, também conhecidas por ornamentais.
As caseiras são muitas vezes utilizadas em exposições, alindando as salas, fornecendo a cor que faltava às mesmas, assim como aparecem orgulhosas dos seus portes em gabinetes de ministros, escritórios de contabilidade, guichets de repartições públicas, etc.
São regularmente regadas para lhes manter o viço. Quem não tem ou não conhece um autêntico, fresco e genuíno par de Jarros, um Mangerico de S.João, uma Buganvília ou um Salgueiro-Chorão?

Portugal







D.Quixote, acrílico s/tela, 81X100cm,2005

(disponível)














Passados 31 anos (quase 33), desde o 25 de Abril de 1974, Portugal está a perder a cor!
Empalidece dia a dia, facto este que está a preocupar políticos, médicos e empreiteiros da construção civil.
Com este fenómeno, surgem os problemas cutâneos, os estigmatismos, as miopias e as perdas de visão total.
Em suma, está-se a implantar no país o albinismo, de olhos pardos e rosados, quase elixir, (lexívia) ganhando adeptos cada vez mais claros, de tez alva e transparente; livres de sujidades, livres de comprometedoras auréolas, ou inoportunos rasgões no vestuário.
Vive-se, pois, uma nova era: a era da clareza e da transparência.




Paisagem Azul,

acrílico s/tela, 130X83cm, 2000

(col. Cândida Ferreira)

Não, não quero.

Não faço tenção, não posso, nem tenho ideia dessa ideia,

Nem vou por aí. Não li.

Não ouvi.

Não vi, nem sou responsável, consultado,

Ouvido ou achado em plenário.

Duvido!

Porém, admito como provável, uma eventual

Possível, passível abordagem deste assunto excepcionalmente curioso.

Causa remota, probabilidade matemática, interessante possibilidade,

Projecto esclarecido, isento, transparente e linearmente claro.

Evidentemente que estou informado.

Efectivamente que vou por aí!

Monday, January 8, 2007

A Pirâmide


Praça do Giraldo, Évora,
acrílico s/tela,150X1oocm, 1998
(col. Victor Esteves)
Um dia,
Há muitos dias,
Inventou-se a
Pirâmide.
Então, muitos homens,
(Os escravos construtores),
Foram delicadamente
Chicoteados
Persuadidos
Estimulados
A construí-las
Em escalas astronómicas.
Os escravos construtores
Permanecem até hoje
Sem alteração visível
Ou aparente
Nas suas fisionomias. ...

Candosa, aldeia fantasma com gente boa.


Candosa, acrílico s/tela, 81X100cm, 2002
(col. particular)














Visito-te


Nos locais


Urdido


E embalado


Por silêncios


Absolutos


E desmedidos.


Sigo,


Passageiro clandestino,


O velho mapa do tesouro.


Em silêncio,


Sempre em silêncio,


Em cais de embarque


Desaguo


Em estuários


Pouco iluminados


Por faróis


De cores opostas.


Em silêncio,


Sempre em silêncio,


Vêm-me imagens


Paradas


De barcos


Estacionados


Ordenados


Em filas


Domesticadas.

Fish!



Fish, acrílico s/tela, 81X100cm, 1999
(col. Miguel Moreira)
Digo
Que me vences
E ganhas
Aos pontos
E por KO técnico.
Declaro
Assim,
E aqui,
A minha rendição incondicional.
E que viva
A tua floresta árida
Onde não passo
De mais uma
Árvorezinha,
E que viva
O teu mar magoado
Onde nadam
Os peixinhos
Com a tua maré.

Tell me why I don't like Mondays? (Segunda-feira)


Alentejana, acrílico s/tela, 40X50cm,2005
(col.Galeria O Rastro)
Segunda-feira
Ela entra
Perspicaz e
Altiva.
Porque é Segunda,
Rubicunda,
Irónica, perspectiva
Cilindro-cónica
De um espaço sideral,
Que me habita o
Neurónio esquerdo.
(Sim, aquele mesmo, junto ao peito). ....

Os anjinhos barrocos



Barragem, acrílico s/tela, 77X77cm, 2002

(col.Exército Português)
















São pequenas e rechonchudas criaturas de asinha de colibri e de louros (?) caracóis nas minúsculas cabeças, muito pouco viris (mesmo para a idade que aparentam).
Das suas trombetinhas brotam normalmente a fífia e outras aleivosias musicais, quando se aproximam em voo perigoso de um incrédulo aeroplano, em vã tentativa de lhe sabotar as hélices.
Rapidamente são sacudidos no ar, sendo rota e velocidade retomadas e cumpridas.
Os pequenos, confinados ao forte compromisso assumido com o grande altar de talha dourada, voltam decadentes, indolentes e servis para o meio das plumas, conchas, volutas, festões e grinaldas de flores.
É neste ambiente, e exalando hálitos a óleo de cedro e a vela de igreja, que os anjos rodeados de cadeirais, púlpitos, grades, banquetas e sanetas, são premiados pelos serviços prestados à terra e à "cultura", assim como por todo o analfabetismo primitivo e anti-higiénico.
Tudo muito ao gosto rococó.

Friday, January 5, 2007

I Me Mine

Amazónia, acrílico s/tela, 81X100cm, 2006

(col. Sónia Pinto)

















O João sonha acordado e sonha também os sonhos dos outros.
Destas e doutras formas de escapismo, acreditam os ingénuos, porque outros, com o pouco talento que têm, e com a emorme habilidade que possuem, não nasceram em berço de ouro como o do meu amigo João.
Estes, conseguem com meia dúzia de lugares comuns e mais três patacuadas, organizar metodicamente uma reputação e uma carreira, recheadas de curiosidades científicas e artísticas, enganando assim o meu amigo João.

Bem-vindo à minha mesa!



Natureza Morta, acrílico s/tela, 80X100, 2007














Laus in ore proprio vilescit
(Louvor na própria boca perde todo o valor



Conheço muito bem o João
Desde cedo que nutre por por si próprio muita admiração e simpatia.
Toma um banho por dia, revela alguma tendência para a mitomania, para a mistificação e para o exagero.
O João, quando se olha ao espelho, descobre sempre algo de novo.
Sente os privilégios que a Mãe natureza (generosa e sábia), lhe soube em boa hora dotar e sente o acentuado cheiro dos narcisos que lhe emolduraram o berço, todo construído em ouro, por seu Pai.
Seu Pai e sua Mãe, embevecidos, o prepararam e embalaram assim para a vida.
Hoje o João faz o favor e dá-me a honra de ser seu amigo.
Por gracejo, por irresponsabilidade ou por ironia, o João inverte factos, adultera assuntos e cria fantasias.


Confessou-me um dia o prazer que isto lhe dá.
O João mente descaradamente com a maior das audácias!
O João é um mistificador dotado de espírito de embuste!
O João é um pantomineiro!